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Aprender fazendo: escolas do RS apostam em projetos práticos no Ensino Médio

  • Data: 20/Ago/2025

Iniciativas com aplicação na vida real têm ajudado a engajar os estudantes nos estudos em diferentes áreas de conhecimento

Misturar diferentes conteúdos e formatos em projetos mão na massa tem ganhado força nas escolas do Rio Grande do Sul. Entre hortas, simulação de júris, participação em eventos internacionais e propostas de “empresas”, estudantes aprendem matemática, biologia, geografia e tantas outras matérias da forma mais interessante possível: fazendo.

Muitas das experiências integram os itinerários formativos do Novo Ensino Médio – as partes flexíveis do currículo – e partem tanto de propostas de professores quanto dos alunos.

Entre os exemplos estão a revitalização da horta do Colégio Nossa Senhora da Glória, por iniciativa de duas alunas, e a promoção de clubes no Colégio Marista Rosário como o Observatório do Clima, que culminará, em novembro, na participação de duas estudantes da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025 (COP30), em Belém.

Horta como espaço de ciência e convivência

No Nossa Senhora da Glória, uma das áreas para as quais os alunos podem enveredar é a Botânica. Dentro dessa trilha de aprendizagem, duas alunas, ao perceberem que havia uma horta pouco utilizada na escola, propuseram a revitalização da área. A sugestão foi aceita e se tornou disciplina ministrada para os três anos do Ensino Médio.

A ideia surgiu a partir da experiência de um colega, que já tinha participado de um projeto do tipo no seu antigo colégio.

—A gente se agarrou nessa ideia e disse “bah, vamos colocar aqui na escola”, porque a nossa horta estava meio que atirada. A gente correu atrás de como que seria toda a infraestrutura, o que a gente ia colocar, onde os lucros da horta seriam investidos. No começo estava uma coisa bem bagunçada, mas fomos dando pequenos passos. Acho muito gratificante, porque penso que esse projeto vai ter continuidade nos próximos anos — conta Maria Gabriela Felipe, 18 anos, uma das idealizadoras.

A proposta foi feita junto com a colega Vitória Domingues, 16 anos, que tem uma horta em casa e já gostava da experiência:

— É legal porque é um lugar para pessoas de diferentes idades interagirem, o que eu acho bastante interessante. Tanto que teve uma vez que a gente veio aqui com os sextos anos e eles plantaram abacate.

Ana Clara Risch Adriano, 17 anos, se inspirou e levou o hábito para casa.

— Comecei a plantar em casa. Teve plantio de suculentas aqui no colégio e levei a suculenta para lá. Ela está muito linda hoje em dia. E teve plantio de sementes também. Aqui a gente ainda não chegou a plantar com a semente, mas, lá em casa, estou na tentativa. Ainda não brotou, mas estou na esperança de dar certo — torce.

Os guris também adoraram começar a mexer na terra. Filipe Lentz, 17 anos, prefere as atividades práticas:

— A gente põe a mão na massa, né? Tá sempre carregando terra de um lado para o outro. Já arrumamos todo o cantinho da frente com as crianças e, mais pra frente, está cheio de mudinhas. Eu gosto mais de fazer essa função de trabalhar e sujar as mãos.

Segundo Arthur Ramos, 17 anos, iniciativas colocadas em prática no Fórum de Sustentabilidade, que acontece anualmente no Glória, começaram a dar forma à possibilidade de trabalhar na horta.

— Teve vários projetos no fórum que as gurias botaram mais em prática, como a composteira e o minhocário. Acho que a gente sempre quis mexer na horta, mas sempre faltou o start, que foi o que as gurias deram — analisa.

Legumes e verduras como cenoura, rabanete e alface já foram plantados pela turma. Agora, a ideia é plantar chás e ervas medicinais.

— A gente vai começar a estudar sobre as plantas que fazem bem para cada parte do corpo, e é uma parte que é bem importante, porque a gente pode usar durante a vida, porque o uso excessivo de remédios faz mal, então usar essas plantas no lugar tem um benefício maior pra nossa saúde — sintetiza Theo Marques, 17 anos.

A professora Daniela Regina da Silva, de Biologia, é quem coordena os trabalhos. Conforme a docente, a busca é por unir teoria e prática:

— A gente tem momentos no laboratório, em que a gente tem toda a teoria, conhecer as plantas, identificar as espécies, planejar os canteiros. Aí a gente alia à prática e ela fica consolidada. Ela dá qualidade para o trabalho. E aí, tu vê o engajamento, a motivação e o quanto nasce disso tudo.

Jefferson Botega / Agencia RBS

Ana Carolina (e) e Júlia embarcam para Belém do Pará em novembro, para participar da COP30.Jefferson Botega / Agencia RBS

Clubes estudantis e integração entre áreas

No Colégio Marista Rosário, um clube tem ganhado uma atenção extra nos últimos tempos: é o Grupo de Educação Ambiental, apelidado de Observatório do Clima. O motivo é que, em novembro, acontecerá a COP30 e duas alunas integrantes do clube viajarão para Belém, no Pará, para participar.

Júlia Dominguez, 17 anos, se aproximou da temática ambiental no ano passado, quando, em um projeto de iniciação científica, fez um trabalho sobre como povos indígenas e ribeirinhos são afetados pelo manuseio incorreto do mercúrio. O estudo foi selecionado para participar da Mostra Internacional de Ciência e Tecnologia (Mostratec), o que animou a jovem.

— A gente não seguiu com esse trabalho, mas o interesse continuou. Foi assim que fui chamada para participar do Observatório do Clima e da COP30. Acho que vai ser uma oportunidade muito legal de levar o que eu já aprendi para pessoas de outras regiões do país e do mundo, e também de reter o conhecimento de outras pessoas em palestras e congressos, para continuarmos construindo um colégio cada vez mais focado na preservação do meio ambiente — pontua a adolescente.

Ana Carolina Dorini, 14 anos, sempre gostou de ciências e foi a outra escolhida para a viagem. Sua expectativa é fomentar um futuro melhor.

— Eu gosto bastante de temas que podem trazer um futuro melhor, fazendo com que a gente pense agora, no presente, com uma mente mais aberta e sustentável, que permita um desenvolvimento também sustentável. Por isso, estou com altas expectativas para a COP30 — ressalta.

De acordo com Diego Brandão Nunes, professor de Geografia do Rosário que acompanha os preparativos para a COP30, a ida das alunas para Belém consistirá na participação de um evento paralelo que reunirá escolas da Rede Marista para falar sobre clima:

— Nós, enquanto escola católica, marista e também sensível às dificuldades que o mundo tem passado, queremos que as nossas escolas coloquem os estudantes como protagonistas de mudanças positivas para o meio ambiente — observa.

Há 15 clubes no colégio, que oferecem possibilidades que vão da tecnologia à diplomacia. Outras iniciativas são o Clube de Relações Internacionais e Simulações Diplomáticas, que já levou estudantes a um encontro na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, e o Conexão Rosariense, jornal semestral produzido pelos estudantes. 

A escola também realiza itinerários interdisciplinares, como análises de cenas de crimes em laboratório, encontros inter-religiosos e projetos de bioética. A proposta pedagógica é integrar o conhecimento técnico à resolução de problemas concretos.

Nicássio Martins da Costa / Arquivo pessoal

Projeto de educomunicação na André Leão Puente abordou temas como redes sociais e inteligência artificial.Nicássio Martins da Costa / Arquivo pessoal

Redes sociais e IA

Na Escola Estadual de Ensino Médio André Leão Puente, em Canoas, um projeto-piloto de educomunicação busca reproduzir experiências comunicacionais no ambiente escolar. A ação é conduzida pelo professor Marcelo Tavares, da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). A área utiliza mídias e tecnologias na promoção da educação.

A atividade envolveu as turmas de 2º ano e abordou a temática de redes sociais e inteligência artificial (IA). Em quatro encontros, os estudantes debateram benefícios e riscos das redes, aprenderam técnicas de produção de conteúdo e formas de usar as ferramentas de forma estratégica no mercado de trabalho. 

A IA foi abordada com demonstrações práticas e discussão ética. A próxima etapa prevê um hackathon: os alunos criarão estratégias de comunicação para uma organização real.

— Ainda há um endeusamento, digamos, dos influenciadores. O nosso papel é questionar: será que, para ser um influenciador, é só pegar o celular e sair falando e produzindo vídeos? Conversamos muito sobre a questão da estratégia, a construção do público, e tem algumas ferramentas que eu utilizei com eles nos encontros que podem ajudá-los a fazer com que esse trabalho seja mais aplicado às áreas de comunicação e marketing — pontua.

A meta é estender a atividade a outras turmas e, no futuro, transformá-la em projeto de extensão da UFRGS.

Sustentabilidade, inovação e cidadania

No Colégio Monteiro Lobato, em Porto Alegre, o itinerário Sustentabilidade e Economia é desenvolvido com o Instituto Caldeira. Os estudantes elaboram protótipos e soluções, como lixeiras inteligentes e lâmpadas solares.

Um dos grupos elaborou um projeto de criar lixeiras que funcionam com um aplicativo no celular no qual o cidadão faz um cadastro, vê onde estão os recipientes mais próximos e abre o contêiner por meio de um QR Code. O sistema põe uma etiqueta no saco de lixo e o usuário tira uma foto mostrando que os materiais foram separados corretamente.

Por dentro, a lixeira separa os materiais sozinha: ela tem sensores, uma parte que gira para jogar o lixo no lugar certo e até amortecimento para vidro. Ela consegue identificar o tipo de material lendo códigos de barras ou pelo som que ele faz quando cai. Caso esteja tudo certo, o usuário ganha pontos e recompensas pelo que fez.

Segundo Thiago Vicentini, professor de Química do Ensino Médio da escola, a parceria com o Caldeira acontece a partir de um eixo de ensino que envolve investigações científicas que buscam resolver problemas sociais: 

— As empresas do Caldeira nos ajudam a trabalhar temáticas que nós, professores de Educação Básica, muitas vezes não temos muito conhecimento, como inovação, como tecnologia e mercado financeiro, como até outras áreas mais específicas da educação mesmo — destaca.

Em Caxias do Sul, o Colégio Madre Imilda promove júris simulados e projetos que vão de drones contra crimes ambientais a conversões de carros para uso elétrico. Já em Lajeado, o Colégio Madre Bárbara leva alunos à Câmara de Vereadores para apresentar projetos de lei e realiza simulações de comitês de crise na área da saúde.

Fonte: GZH

Foto: Jefferson Botega / Agencia RBS

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