Brasil aprova uso de membrana amniótica colhida em partos para tratar queimaduras no SUS; entenda
Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec) aprovou na última sexta-feira (9) o uso dessa tecnologia no país
O Ministério da Saúde deu um passo importante no tratamento de queimaduras no Brasil: a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec) aprovou, na sexta-feira (9), o uso de membrana amniótica como curativo biológico para pacientes queimados no Sistema Único de Saúde (SUS).
A decisão, válida para todo o país, é considerada um avanço na medicina regenerativa e no cuidado com os pacientes queimados.
A tecnologia permite a substituição dos curativos convencionais por um material biológico colhido após o parto por cesariana — mediante autorização da mãe. No Rio Grande do Sul, as membranas amnióticas já haviam sido utilizadas anteriormente, mas de maneira emergencial, para tratar as vítimas da tragédia da Boate Kiss, em 2013.
O cirurgião plástico Eduardo Chem, coordenador do Banco de Tecidos da Santa Casa de Porto Alegre, relembra o caso e comemora a aprovação:
— Na época da tragédia da Kiss, uma medida emergencial permitiu que recebêssemos membrana de outros países para tratar queimados, já que o Brasil não tinha regulamentação. Acabaram sobrando membranas amnióticas, que o Sistema Nacional de Transplantes nos autorizou a estocar e a usar, e assim fizemos. Com isso, nos demos conta que faltava uma regulamentação aqui.
Essa tecnologia também já havia sido aprovada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) em tratamentos clínicos em 2021, mas faltava a autorização da Conitec, concedida agora. Com a aprovação oficial, o Brasil se junta a países como Estados Unidos, Argentina e Chile, que já utilizam amplamente a membrana amniótica na medicina.
A aprovação era muito aguardada, segundo a diretora do Hospital de Pronto-Socorro de Porto Alegre, Tatiana Breyer:
— Estamos muito felizes, é uma enorme conquista, esta membrana estava há mais de 10 anos aguardando aprovação da Conitec. No ano passado e este ano houve toda uma mobilização da sociedade civil organizada, nos empenhamos em votar para que isso fosse aprovado, porque realmente faz toda a diferença para os pacientes. Com essa aprovação, estimamos que vamos ter uma redução no custo do uso dos curativos e uma facilitação no manejo dos pacientes.
Entenda o tratamento
A membrana amniótica é um tecido retirado da placenta após partos cesarianos, modalidade que representa menos risco de contaminação do material na comparação com partos vaginais.
A doação de membrana só é feita com a devida autorização da mãe, e a expectativa de Chem é que haja abundância de material, já que o material costuma ser descartado.
O médico vai abordar uma família que está vivendo o momento mais bonito de sua vida e perguntar "Olha, o neném nasceu e esse tecidos, a placenta e o envoltório dela, vão ser colocados no lixo. Só que isso pode ajudar a salvar vidas, que tal doar?". É muito diferente do contexto da doação de pele, que é um momento delicado onde, muitas vezes, o doador é um paciente jovem que veio a óbito
EDUARDO CHEM
Coordenador do Banco de Tecidos da Santa Casa de Porto Alegre
A atuação da membrana é como um curativo biológico temporário, capaz de cobrir feridas, aliviar a dor e estimular a cicatrização de forma mais eficiente e menos custosa do que os curativos sintéticos tradicionais. Cada membrana amniótica doada tem cerca de 750 centímetros quadrados. Após o processamento, são transformadas em lâminas de tecido, e várias delas podem ser aplicadas várias para cobrir a queimadura. Dentro de quatro a cinco dias, esta membrana é rejeitada pelo organismo e começa a se esfarelar, mas, nesse meio tempo, já auxiliou na cicatrização.
— Num tratamento de queimadura, fazemos o debridamento para retirar o tecido desvitalizado, seguido de um curativo. O curativo normalmente é à base de prata, ou de pele sintética, que custaria, por exemplo, cerca de R$ 50 mil para tratar uma queimadura no rosto, ou então curativos mais simples, que mesmo assim custam cerca de R$ 10 mil. A alternativa que teremos agora será gratuita.
Com a decisão da Conitec, todos os bancos de tecidos do Brasil poderão utilizar a membrana amniótica.Santa Casa de Porto Alegre / Divulgação
Impacto da autorização nacional
Com a decisão da Conitec, todos os bancos de tecidos do Brasil poderão utilizar a membrana amniótica no tratamento de queimados. A medida deve aliviar a escassez de pele humana e e ampliar o acesso ao tratamento.
— Hoje o Banco de Tecidos da Santa Casa consegue atender cerca de 50 pacientes por ano com pele de doadores falecidos. Agora vamos contar com uma alternativa biológica segura, de alta eficácia e ampla disponibilidade para atender toda a demanda de queimados do país, que anualmente soma mais de um milhão de caso — afirma Chem.
Após ser autorizada pela mãe, a coleta de membrana amniótica é feita na maternidade do hospital e, então, enviada ao banco de tecidos, onde passa por esterilização com soluções específicas em laboratório de microbiologia. Depois, é armazenada em sacos plásticos para esse fim e condicionada em freezers. Por fim, é distribuída por meio da Central Nacional de Transplantes para os hospitais do país.
Apesar da aprovação pela Conitec, ainda falta estabelecer os protocolos de coleta, transporte, esterilização e armazenamento. A primeira reunião técnica para definir tais protocolos vai ocorrer na quinta-feira (15), em Brasília. A expectativa de Chem é que a utilização da membrana amniótica nos hospitais comece em poucos meses, mas ainda não há uma definição quanto a isso:
— Está havendo uma consulta pública para possivelmente utilizar a membrana também em oftalmologia, em lesões oculares, e depois vai haver consulta para uso em ginecologia, no tratamento de endometriose, e muito breve em úlceras varicosas, cirurgias vasculares, diabéticos e pacientes que têm feridas crônicas também — projeta o cirurgião plástico.
A expectativa da diretora do HPS, Tatiana Breyer, que já solicitou agenda com o Banco de Pele da Santa Casa, é poder incluir a membrana amniótica no tratamento de queimados o quanto antes e em larga escala.
— Temos muita experiência no tratamento de queimados com certeza seremos um polo de utilização dessa tecnologia em larga escala, tão logo ela seja disponibilizada. No momento estamos com uma certa contingência justamente por conta das questões de financiamento do tratamento de queimados — afirma Breyer.
No momento, o HPS tem quatro leitos disponíveis para grandes queimados, os quatro ocupados. Até abril, eram dez leitos, sempre lotados. Breyer projeta mudança nesse cenário:
— A restrição de atendimento é algo que por sinal poderá ser redescutido se conseguirmos diminuir os custos com curativos. Talvez poderemos até abrir mais vagas.
Fonte: Gaúcha ZH
Foto: Santa Casa de Porto Alegre / Divulgação
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