Quase um ano após enchente, Vale do Taquari ainda sofre impactos econômicos por danos em estradas
Pontes na BR-386 e na RS-130 foram recentemente liberadas, amenizando transtornos. Governo federal e concessionária afirmam priorizar liberação do trânsito na área, enquanto realizam estudos para tornar as vias mais preparadas para novas enxurradas
As últimas semanas foram alvissareiras para os milhares de motoristas que circulam pelas rodovias do Vale do Taquari. A liberação das pontes sobre a RS-130, entre Lajeado e Arroio do Meio, e sobre a BR-386, entre Estrela e Lajeado, resulta em menos tempo de congestionamentos, facilitando o escoamento de grãos na estrada conhecida como Rodovia da Produção. Na enchente do ano passado, trechos da BR-386 foram levados pela enxurrada, destruindo vidas, isolando comunidades e afetando a economia do Estado.
A ponte seca sobre o Arroio Boa Vista e a estrutura sobre o Rio Taquari eram pontos críticos. A recuperação destes trechos foi concluída recentemente.
"Prioridade foi liberar o trânsito"
As obras de reconstrução estão sendo feitas obedecendo aos mesmos parâmetros de antes da cheia do Rio Taquari, que chegou a alcançar 30 metros.
A CCR ViaSul explica que priorizou fazer serviços de recuperação emergencial. Para haver alteração na altura de pontes e elevação de trechos da rodovia, por exemplo, é preciso elaborar um projeto e buscar aprovação da Agência Nacional dos Transportes Terrestres (ANTT), o que demanda tempo. A empresa, porém, garante que já realiza estudos, mas ainda não há um prazo para implementação.
— Não existe começo ou recomeço sem infraestrutura. Regiões se desenvolveram por ferrovias, hidrovias e rodovias — afirma o presidente da Cooperativa de Transportes Vale Log, Adelar Steffler.
Em nota, a ANTT informou que buscou, primeiro, aprovar a reconstrução da BR-386, de forma emergencial, para restabelecer rapidamente o tráfego e que está analisando propostas para tornar a rodovia mais preparada para eventos extremos (leia a íntegra abaixo).
A CCR ViaSul, concessionária que administra a rodovia, calcula que serão investidos R$ 300 milhões. A rodovia teve mais de 60 pontos diferentes afetados com a enchente do ano passado.
Estão em obras ainda dois trechos apontados pela concessionária como gravíssimos na BR: o km 288, em São José do Herval, e o km 308, em Pouso Novo. A previsão da concessionária é que as intervenções necessárias sejam finalizadas até junho.
Contraponto
O que diz a ANTT
A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) informa que buscou, primeiro, aprovar a reconstrução da BR-386, de forma emergencial, para restabelecer rapidamente o tráfego. A autarquia garante que já está analisando propostas para tornar as estruturas da rodovia mais resilientes a eventos climáticos extremos.
A concessionária foi solicitada a apresentar estudos com alternativas técnicas e contratuais que levem em conta os impactos causados por chuvas intensas e sinistros, conforme diretrizes da Política Nacional de Outorgas Rodoviárias", diz nota da agência.
A CCR ViaSul informou à ANTT que pretende concluir os estudos até o final do primeiro semestre de 2025. Depois disso, a agência fará as análises necessárias.
Cada minuto conta
Essa espera pelas obras necessárias pode custar vidas. Segundo o diretor-executivo do Hospital Bruno Born, Cristiano Dickel, cada minuto conta quando um paciente grave fica parado no trânsito. A instituição atende 3,9 mil pessoas por dia. Desse total, 65% vêm de municípios vizinhos.
Cristiano Dickel avalia o impacto na saúde com o atraso das obras.André Ávila / Agencia RBS
— Quando se lida com saúde, cada minuto é muito importante. Cada minuto que um paciente com Acidente Vascular Cerebral (AVC) perde de não estar dentro de uma instituição, dois milhões de neurônios são perdidos. Então, calcula-se isso se esse paciente levar 20, 30, 40 minutos para vir aqui no hospital — avalia Dickel.
Frete caro
Empresas do Vale do Taquari estão sendo punidas duplamente. Além de terem sido afetadas diretamente pela enchente, sofrem com o custo logístico, que aumentou.
A engenheira química Michele Gonçalves, 41 anos, é diretora da Tintas Nobre, em Arroio do Meio. A fábrica, com 60 funcionários, ficou sem acesso durante vários dias após a enchente.
Michele Gonçalves, 41 anos, é diretora da Tintas Nobre.André Ávila / Agencia RBS
O centro de distribuição da empresa, localizado no Paraná, conseguiu garantir o abastecimento dos clientes de fora do Rio Grande do Sul por cerca de 15 dias. Depois disso, as entregas passaram a ser feitas com um preço mais alto. Com estradas afetadas ao longo do último ano, Michele viu o valor do frete subir em 10%, o que aumentou o custo logístico.
— O custo aumentou na época das cheias e ali ficou neste valor. Em momento algum recuou. A gente entende que teve aumento de dólar, de diesel, do combustível e tudo mais. Mas aqueles 10% da enchente nunca recuaram — avalia Michele.
Problema semelhante vive o criador de porcos, Alexon Teobaldi, que atende à empresa BRF. Há 15 anos trabalhando no setor, na cidade de Relvado, ele ouve reclamações dos transportadores quando uma carga precisa ser levada.
— A gente tá correndo atrás ainda pra chegar como a gente estava antes da enchente. A gente perdeu, todo mundo perdeu — comenta o criador de 2,4 mil suínos.
Criador de porcos em Relvado sofre com o aumento do frete.André Ávila / Agencia RBS
Investir fora
A dificuldade de logística enfrentada por empresas gaúchas, com unidades fora do Rio Grande do Sul, pode ocasionar um maior investimento longe do Estado. É uma avaliação que já está sendo feita pela Scapini Transportes.
Empresa tem investido fora do Estado.André Ávila / Agencia RBS
A empresa, com sede em Lajeado, tem 1,3 mil funcionários, contando com suas 32 filiais pelo Brasil. Ela teve R$ 20 milhões de prejuízo com a enchente.
— A gente é do Vale do Taquari, mas, realmente, depois dos últimos eventos que a gente teve aqui, principalmente as últimas cheias, os investimentos nossos estão indo para outros Estados, justamente para evitar uma calamidade igual como tivemos — revela o CEO Lucas Scapini.
Alívio
O agricultor Diego Rodrigo Fuhr, 40 anos, é um dos beneficiados com a recuperação dos trechos com pontes na região. Morador de Arroio do Meio, ele precisa se deslocar três vezes por semana ao Hospital Bruno Born, em Lajeado, para realizar hemodiálise. Durante a maior parte de 2024, ele levou o dobro do tempo do deslocamento.
— A gente precisava sair antes de casa, tinha menos tempo para descansar. Às vezes, o calor também afetava. Porque, após o processo de hemodiálise, muitas vezes tem a reação. A gente sofre devido ao tratamento. E aí tinha esse estresse no trânsito — desabafa Fuhr.
Paciente se desloca de Arroio do Meio para Lajeado.André Ávila / Agencia RBS
Soluções futuras
A comunidade da região também discute mais opções de deslocamento. Uma delas seria a construção de uma nova ponte sobre o Rio Taquari. Em sete meses, a atual foi interditada três vezes.
— Grande parte das mercadorias do hospital são produzidas fora. E são trazidas por essas rodovias. Então, para que esse hospital continue crescendo, para a região continuar crescendo, para a gente poder ter cada vez mais qualidade e atender cada vez mais pessoas, precisamos mais alternativas de acesso — destaca Dickel.
Outra alternativa é a construção de um anel viário. A ideia é tirar o grande fluxo de veículos de Lajeado e Estrela. Movimento semelhante já foi feito no na Grande Florianópolis, quando a BR-101 foi duplicada.
Diego Tomasi.André Ávila / Agencia RBS
Dentro desta ideia, duas novas pontes precisariam ser construídas. Uma entre Arroio do Meio e Colinas. A outra entre Estrela e Cruzeiro do Sul. A ideia é apresentar a proposta ao ministro dos Transportes Renan Filho para que a obra seja realizada pelo governo federal.
— A gente não consegue mais ficar competitivo no mercado. O recado está dado. Não existe sinal mais claro — projeta o diretor-executivo da Tomasi Logística, Diego Tomasi, também de Lajeado.
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